"Suicídio. Sinto o gosto das lágrimas queimando-me a face gélida e assustada. Seco com as mãos a umidade indevida que me incomoda. Respiro lentamente e fecho os olhos, tentando me lembrar o porquê de eu estar aqui, cercada de remédios e objetos medonhos. Mais uma vez, as lágrimas escorrem frenéticas pelo meu rosto, e uma linha de compreensão começa a se formar dentro do meu olhar. Ah, então eu estava ali por minha causa, quer dizer, ninguém era culpado por nada disso. Pois bem, em toda a minha vida (que vamos assumir, não é tão extensa assim) eu culpei as pessoas por eu estar infeliz. Sempre fui do tipo lamentadora-infeliz-insuportável, se havia algum motivo para sofrer, eu me agarrava a esse motivo e vivia sob a constante infelicidade causada por um motivo banal. E era assim sempre, as vezes essas crises de infelicidade forçada duravam meses, as vezes alcançavam um ano. E eu não deixava pra lá, não parava de reclamar, nem ao menos me esforçava para as coisas melhorarem. Eu simplesmente me acostumei a sofrer. Porque, talvez, sofrer fosse menos doloroso do que enfrentar a vida. Um momento você está lá, rindo, contente com a piada que um amigo contou, e de repente você perde esse amigo, e tudo se transforma em um grande buraco escuro. Isso seria demais para mim, essas perdas dolorosas e esse futuro incerto demais… Essas coisas, eu não as suportaria, sou um ser humano fraco e tolo. E com essa minha mania de drama, eu sempre acabei tornando tudo pior, tornando pequenas frustrações em motivos para me trancar no quarto e só sair de lá quando eu sentisse que as coisas estavam normais de novo. Mas é claro que um comentário ali ou aqui sempre me afetavam, mas não era para afetar tanto, era para ser superado no dia seguinte, ou na outra semana. Mas não, comigo o comentário era levado até que eu me esquecesse dele, e quase nunca eu me esquecia. Eu disse, eu sempre gostei de sofrer, era tranquilizante saber que eu teria uma desculpa para me tornar apenas um enfeite na vida de todos. Porque com o tempo, as pessoas esquecem de você. Não os culpo, eu sei que eu sempre fugi das pessoas, do amor e, na maioria das vezes, fugi da família também. Gosto de me isolar, de ficar quieta ouvindo o som do meu próprio choro ou só o vento que passa rasgando o silêncio da noite. Gosto de sentir saudade, porque isso me recorda do quanto eu já fui capaz de ter pessoas importantes comigo. Ah… Pessoas que não voltam mais, garanto. Então numa noite fria, eu tento lembrar o porquê disso tudo. Do drama, da choradeira insuportável e desse maldito aperto no peito, que surge do nada e não vai embora nunca. É quase um buraco, que não tem motivo para estar ali, quer dizer, falta de amor talvez, mas nada grandioso demais, nada que não possa se superar em alguns meses. Mas eu não supero, porque eu adoro um drama, adoro tudo que faz mal, e se eu tenho um aperto no peito, ele vai ficar lá até que eu canse desse pequeno drama e comece a deixar pra lá. Só que eu nunca deixo nada pra lá, mesmo que isso me cause enormes feridas, eu vivo a dor, eu respiro a dor, eu acho que… eu gosto da dor. Então eu vivo cheia de marcas, reclamações e um bocado de falta de amor próprio. E assumo que tudo isso não deveria existir, que eu deveria ser forte ou sabe-se lá o que eu deveria ser. Só que agora nada disso tem importância mais, não agora, não quando eu estou decidida a colocar um fim em todos os meus dramas e feridas. Eu tenho um amor absurdo pela vida, o problema, o pequeno problema, é que eu não tenho amor por mim. E é isso, quando se decide cometer um suicídio, não é devido a infelicidade em um relacionamento ou frustração na vida, é só por causa de si mesmo, por não estar bem consigo mesmo, e decidir que o melhor para si, é desistir. Não adianta culpar os outros por querer desistir da vida, a culpa sempre será daquele que desistir, porque ele não lutou, porque ele nem tentou, porque ele foi fraco. O suicídio nada mais é do que um adeus dado por aqueles que não queriam nem ter dado um “olá”. "